PARTE I
PARTE II

LEIA A ÍNTEGRA – Parte I E II

Embora esta reflexão, EM DUAS PARTE, dure alguns minutos a mais do que as de costume, face à repercussão e os debates havidas na semana  passada em função de uma audiência do Papa Francisco, quero convidar a você e a todos os que  se envolveram, ou estão envolvidos nesse episódio através nas redes sociais  ou simplesmente em seu meio, ou consigo mesmas, peço que reflitam comigo até o final para que suas análises sejam cada vez mais lúcidas e você seja cada dia mais bem informado. Dedique essa  meia hora, por favor.  

Nunca a humanidade em tão pouco tempo passou por tamanhas transformações como as que estão ocorrendo desde esses últimos cem anos. Essas transformações, consequência dos avanços da Ciência e da Tecnologia, estão acontecendo hoje e continuarão acontecer para o futuro, numa dimensão e numa velocidade crescentes. Não há como desconhecê-las ou não  considerá-las. 

Sem maior análise pode-se considerar que na história, desde seu início, sempre houve mudanças e é graças a elas que a humanidade, saindo das cavernas, construiu a civilização em que estamos vivendo. 

Mas essas mudanças ocorridas no tempo da pré-história, ou da história, aconteciam em séculos, em milhões de anos, ou milhares de gerações. As transformações, que estamos vivendo, estão acontecendo no espaço de duas ou três gerações e, cada vez mais, acontecerão em apenas uma geração a caminho de se tornar um processo continuo. Não estou fazendo história do futuro nem ficção. Estou simplesmente me referindo ao processo que estamos vivendo. 

Esse processo de sucessão de mudanças, que está se acelerando em velocidade exponencial, para onde levará a humanidade, essa humanidade da nossa, ou das gerações mais jovensessas que irão nos sucedere viverão em plena era da mudança contínua? 

Segundo o livro “Por uma Civilização Participativa e Solidária: A PROPOSTA” no mesmo ritmo em que ocorrem as mudanças, torna-se necessária, como condição de sobrevivência de tudo o que se modifica, sua contínua reordenação. Quando isto não acontece, acaba ocorrendo a desorganização e a desorganização significa a ruptura, ou a morte. 

A grande questão, no entanto, é que muitas pessoas, ou muitos segmentos da sociedade não estão tendo consciência desse necessário e urgente processo de contínua reordenação, e de como administrá-lo. 

No mundo material, das coisas, esta reordenação ocorre automaticamente, e quando por alguma razão, que a ciência ainda não definiu, deixa de ocorrer, acontecem os desastres naturais. 

 Mas no que se refere ao ser humano, por causa da consciência da qual resulta a liberdade, o processo de reordenação exige a intervenção continua da própria consciência, das faculdades que a constituem, a percepção, a capacidade de análise, o correto uso da imaginação e da lógica, para evitar o conflito, que  à medida que se agrava, produz a ruptura, a desorganização ou a morte. 

Bom exemplo desse conflito ocorre quando a sociedade se divide em seus extremosou  sus fundamentalismos. Dou como exemplo, no mundo muçulmano entre as várias correntes que o fragmentam, ou no nosso meio, entre esquerda e direita, ou entre conservadores e progressistas. Adoto essas expressões apesar dos reparos que merecempois todas as partes– a direita e a esquerda, ou os conservadores e progressistas, propõem muito pouco em termos de inovação, todas agarradas à teorias, ou ideologias e práticas que tiveram origem há dois ou três séculos e que teimam em permanecer até hoje e para o futuro, como se a realidade não tivesse se transformado e fosse possível imobilizar a história. 

Essas considerações tem ampla e permanente validade, mas hoje quero aplica-lasàs questões que afetam grande parte dos fiéis da Igreja Católica, especialmente envolvendo o Papa Francisco, no campo doutrinário, no campo pastoral e ainda no campo político, chefe de Estado que também ele é, do Estado do Vaticano.  

Esta multiplicidade de funções do papa, em outros tempos ele usava como símbolo desse poder a tríplice coroa, envolvem, o obrigam, além de sua condição de Chefe de Estado e independentemente das razões de ordem religiosa -doutrinária ou pastoral, a manter reuniões com outros Chefes de Estado ou personalidades políticas, da  direita da esquerda, ou de qualquer outra condição. 

Quero inicialmente incluir nessas múltiplas funções a traumática audiência concedida pelo Papa Francisco a Lula, Luiz Inácio Lula da Silva, ex-Presidente do Brasil. Este trauma, sem maior repercussão a nível internacional, ocorre no Brasil porque o ex-presidente ainda é considerado representante de umdas muitas corrente da esquerda, o Partido dos Trabalhadores. 

Mas sobretudo decorre por estar ele respondendo diante da justiça brasileira por uma dezena de processos, acusado de corrupção, lavagem de dinheiro e desvio de recursos públicos em benefício de si mesmo ou de seus diversificados grupos de apoio, tendo sido condenado em diversas instâncias da Justiça. Sob este aspecto, este encontro pode ser considerado um confronto com a justiça brasileira, ou pode ser interpretado por muitos como o apoio do Papa a um grupo, ou a um partido responsável por graves acusações e condenações havidas, por crimes contra o patrimônio público.  

Isto tudo indica que o que pode ter ocorrido pode ter sido uma falha na análise e nas informações da hierarquia católica brasileira, e devo incluir a CNBB que parece confundir ser errática com ser consensual, como também a Nunciatura Apostólica, e seus prováveis equívocos na análise das consequências políticas desse gesto e especialmente dentro da própria Igreja no Brasil. Ao conjunto dessas razões, devem somar-se, ainda, razões de ordem diplomática, e outras, que não devem ter sido adequadamente consideradas. 

Por tudo isto, considero inadequado enquadrar o Papa Francisco de forma simplista, como sendo comunista, até porque o comunismo como doutrina é um conceito e uma prática que nada tem a ver com o socialismo, ou outras correntes ditas de esquerda. Por razões semelhantes também não teria sentido enquadrá-lo como de direita, ou capitalista, por ter visitado, ou recebido o Presidente americano Donald Trumpo Presidente brasileiro Jair Bolsonaro ,ou o primeiro Ministro de Israel, Nethanieau, expoentes da direita. 

O papa vive, nesse difícil equilíbrio, que enseja a justificativa, referente ao dever de acolher a todos que o procuram, ou a quem deve procurar, independentemente das posições políticas, ideológicas, ou dos pecados de cada um no contexto da fé.  

Mas este é um argumento facilmente interpretado como escapista, simples ou simplório, por não considerar seu significado público e as repercussões externas, ou as repercussões que tem as atitudes do papa no exercício de suas múltiplas funções, inclusive de Chefe Supremo da Igreja Católica 

O mínimo de conhecimento que se tenha do comunismo, em suas múltiplas formas, não permite afirmar tal coisa. 

 O comunismo segundo Marx, a doutrina marxista original, nunca existiu na prática. O processo de coletivização proposto por ele, parou nas “ditaduras do proletariado”. O comunismo do Império soviético, desapareceu há mais de 20 anos. O comunismo chinês caminha para um capitalismo selvagem sob a perspectiva econômica enquanto mantém o controle absoluto no campo ideológico.  

Em Cuba a mística dos irmãos Castro acabou com a retirada da União Soviética, e hoje sobrevive  até da venda de sua mão de obre no exterior, pagando o preço do isolamento como resultado de sua corajosa aventura. Na Venezuela, há uma ditadura pura e simples, sem ideologia nenhuma, a não ser a de sustentar a corrupção. Na Coreia do Norte….bem 

Não. O Papa Francisco não tem como ser enquadrado como sendo comunista, capitalista, nem tem sentido acusalo como sendo da direita ou da esquerda. 

 Mas se me perguntarem- o que então ELE é, uma pergunta óbvia, direi que lhe falta a estratégia e a clareza, que aliás não é responsabilidade só dele mas  é compartida com seus conselheiros, bispos, cardeais ou leigos, para  marcar rumos e  dar um passo à frente, ou ultrapassar qualquer uma dessas ideologias, ou desses regimes, destravando e fazendo caminhar a história no rumo de uma nova síntese social, como foi a participação da Igreja na história ,especialmente nos últimos  séculos 

Falta-lhe a perspectiva ou a oportunidade que teve seu antecessor, Leão XIII e os que o assessoravam, que lançando, diante da proposta revolucionária do comunismo e do capitalismo que consolidava as desigualdades no mundo, a Encíclica Rerum NovarumSobre os Novos Tempos, ou literalmente, Sobre as Coisas Novas, 

 Esta histórica Carta fixou com clareza a Doutrina Social, ou política da Igreja, além de seu tempo e das ideologias que dominavam ou lutavam por dominar o mundodestravou a história e, mais do que qualquer outro documento da época, serviu de fundamento para a organização da sociedade, especialmente no mundo das relações do capital e trabalho, um  novo mundo da justiça, da liberdade e da democracia como a entendemos hoje .Foi um passo à frente. 

Mas não parou aí o passo à frente das ideologias e dos regimes vigentes, dado pelos Papas. 

Passados 40 anos da Rerum Novarum Pio XI comemorou a data com a Encíclica Quadragesimo Anno .Em 1963, João XXIII ,mal iniciado o Concílio Vaticano II” definiu o papel da Igreja no mundo  com a Encíclica Mater et Magistra– a Igreja, Mãe e Mestra, encíclica que 4 anos depois, já encerrado o Concilio, Paulo VI completou com a “Popularum Progressio-Sobre o Desenvolvimento dos Povos. Seria longa a listagem de outros documentos, desses mesmos e de  outros papas, sobre a posição da Igreja diante do mundo, ou da história, postas muito além das ideologias ou dos regimes em voga. 

Poderia citar ainda, entre outras aencíclicas de João Paulo II Centesimus anno e Labor Exercensdo Papa Bento XVI Caritas in Veritasou do próprio Papa Francisco, especificamente sobre a questão ambiental, a Encíclica, Laudato Si… 

Os que atentam por toda essa história concluirão com certeza que é absolutamente inadequado, que as posições da Igreja Católica diante da evolução da história, ou do mundo, ou que  posição ao Papa Francisco possam ser julgadas à luz de um fato minúsculo como a controvertida audiência, minúsculo pelo que possa ter sido dito ali, pelas minúsculas ilações do personagem nele envolvido e de seus seguidores, da imprensa, ou de pessoas, minúsculo evento diante do mundo, ou da história; 

No entanto, para que esse fato minúsculo não passe a ter um significado além de sua insignificância, penso que o Papa Francisco  e seus conselheiros, cardeais e bispos, Comissões e Conferências ,estão devendo ao mundo, dividido entre esquerda e direita, conservadores a progressistas, comunismo ou capitalismo, enfim diante de todos os extremismos herdados do passado e persistentes num mundo transformado, estão devendo, dizia, um novo documento, capaz de mostrar que  há  caminhos alternativos, um passo à frente com a história, ou uma nova Síntese social capaz de ultrapassar a tese e  a antítese herdadas do passado e que tem a pretensão de construir o futuro. 

Nenhum dos documentos, referidos, públicos, claros e transformadores, foram acusados de serem da direita ou da esquerda, comunistas ou capitalistas, conservadores ou progressistas. Foram sim, um passo à frente, dado com oportunidade, coragem e competência. 

Parece- me que essa dimensão e seu significado no mundo da Igreja e na    história do mundo, está esquecido pelos que, da hierarquia ou da sociedade, fazem por empurrar a Igreja, ou o Papa  para a direita ou para a esquerda, para o passado ou para a ilusão da correção de sistemas essencialmente maus em que vivemos.  

Lembro que a expressão, essencialmente mau, foi aplicada pela Rerum Novarum ao comunismo. Mas considerados os frutos da injustiça, da concentração e da exclusão dos sistemas vigentes, que negam um mínimo de dignidade a quase um terço da humanidade, num mund comandado pelo capitalismo, hoje, mais de UM SÉCULO DEPOIS, exige que seja a mesma expressão, aplicada nos mesmos termos ,essencialmente mau, ao CAPITALISMO.  

A Igreja, pois ,não pode estar  a acolitar esse ou aquele, esquecendo que sua tarefa não é fortalecer este ou aquele, mas  é iluminar os caminhos do mundo ou da história, para que o mundo caminhe na história pelo caminho da justiça ,da paz e do amor, no respeito e na promoção da dignidade humana, de todos os seres humanos, ou da construção da cidade de Deus entre os homens. Nenhum dos regimes que aí estão tem consciência desta construção.  

Não precisa ser filósofo, ciência que não deveria faltar aos escalões da hierarquia da Igreja e que certamente não falta ao Papa Francisco discípulo de Santo Inácio de Loiola e de Sto.Tomaz de Aquino, para distinguir no processo, o que  pertence à essência, que deve permanecer para que  todo o edifício permaneça de pé, do que pertence ao conjuntural, ao acidental, com que  se reveste  o edifício, de acordo com a época, a cultura ou as idiossincrasias de quem quer que seja 

É este acidental, que as vezes chega às raias do perfumático, que deve ser mudado no mesmo ritmo em que o mundo muda para que, como ensina o princípio bíblicoa Igreja estando no mundo, não pertença ao mundo. 

Também não precisa ser teólogo para perceber que Jesus Cristo ao dar acolhimento aos pecadores, ditou a Maria Madalena, mulher da vida, que fosse adiante mas que não pecasse mais, ou que perdoou Zaqueu, o cobrador de impostos que se apoderava de parte do dinheiro arrecadado em benefício próprio, depois de ter recebido dele a promessa de que devolveria todo o dinheiro roubado. Nem simplesmente acolheu, nem simplesmente perdoou. 

Para não continuar na mesma disputa entre esquerda e direita, ou passar a mão sobre a cabeça dos ladrões e prostitutas- esses que excluem mais de um terço da humanidade dos benefícios do desenvolvimento, a economia segundo Francisco, inclusive em seu Encontro programado para breve em Assis, espero que ultrapasse o papel de um simples remendo aposto aos sistemas do passado, esse tecido gasto do comunismo ou do capitalismo.   Espero também que ultrapasse a condição de um simples libelo para condenar um ou outro, ou ambos ou de apenas transformar-se numa reunião de pessoas piedosas e compassivas a acolher os excluídos, enquanto os sistemas e suas ideologias continuam a excluí-los em dobro. É neste fato essencial que deve se concentrara a Igreja se quisermos uma nova economia, ou uma nova civilização segundo o Francisco-de Assis ou do Vaticano 

Se não houver esta  ultrapassagem temo que as mudanças propostas serão feitas apenas para que tudo, remendado ou não, continue como está ,como seguidamente tem acontecido. 

O mundo, os cristão e todos os homens de boa vontade, esperam da Igreja e especialmente do Papa Francisco em quem tantas esperanças foram depositadas, que indique os novos caminhos, uma nova Civilização capaz de responder aos avanços da Ciência e da Tecnologia, também dádiva de Deus aos homens, a Ciência e a Tecnologia, através dos homens, e para servir aos homens, não para destruí-los. 

Se não for possível abrir esse novo caminho, tudo acabará em a nada e o sonho de uma nova economia segundo Francisco, ou de uma nova   Civilização Participativa e Solidária, não terão passado de um sonho numa noite de verão, ou numa noite de outono, precursora do inverno que, a passos largos, pode estar se aproximando. 

One thought on “O Papa Francisco- a Esquerda, a Direita e os caminho da Civilização 

  1. João Zanatta

    Concordo com que a doutrina católica não deva se pautar por se posicionar em relação ao comunismo ou ao capitalismo mas sim, sobre o tema fundamental da dignidade humana, cujos princípios advêm da doutrina cristã definida pelos doutores da Igreja, com base no Evangelho de Cristo. O principal doutor da Igreja é Santo Tomaz de Aquino, que o Bergoglio relegou a um plano de total esquecimento, substituindo-o por Hegel, Heidegger, Maritain, Teillhard de Chardin, de Lubac, Juan Carlos Scannone, este, seu consultor particular em teologia. É a teologia do povo, ou melhor, a “teologia argentina do povo e da cultura”. Pura teologia da libertação, antropocêntrica, marxista, relativista, imanente, que sibstituiu a teologia tradicional da Igreja, cristocêntrica, revelada, transcendental. Por isso, não acredito que Bergoglio, ilegítimo, porque eleito pela máfia de Saint Gallen na catacumba, isto é, extra conclave, vá pautar sua ação com base nos princípios doutrinários católicos, inegociáveis, aliás, como está fazendo diariamente.

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